Autor: Chabouté
Editora: Levoir
Título original: Contruire un feu
Tradução: João Miguel Lameiras
Introdução: Pedro Bouça
Data da Edição: 2020
Álbum cartonado: 88páginas
ISBN: 978-989-862-873-8
Preço: 10,90 €
Dimensões: 214 x 295 mm
Análise
A adaptação de um texto literário para a banda desenhada é
sempre um risco, que reside em fazer apenas uma transcrição total das palavras
originais, ilustrando-as. Essa é a opção de alguns autores portugueses que,
pode render do ponto de vista comercial, em relação a algumas obras, mas que na
perspetiva da narrativa gráfica é pobre, pois o texto possui toda a informação possível.
A imagem não vem acrescentar nada de novo.
Há outras opções que passam por usar apenas parte do texto,
ou então modificá-lo, extirpando-o de pormenores mais descritivos.
Chabouté segue um caminho diferente. Usa algumas expressões do
texto original, mas modifica-o do ponto de vista da relação entre o narrador e
a personagem. É como se Chabouté criasse um texto novo.
Chabouté consegue, usando um número não muito elevado de
palavras, transferir para as páginas deste livro todo o conteúdo da obra de
Jack London, e para fazê-lo usa a imagem. A obra está de tal forma estruturada,
que se lhe retirássemos as palavras, toda a história era perfeitamente
entendível e muitos dos sentimentos da personagem eram percetíveis. Alguma
informação seria perdida, mas também dá para perceber que se, Chabouté
quisesse, teria eliminado mais palavras, acrescentado mais imagens e a mensagem
teria sido passada de modo claro e legível.
O desenho não tem muitos elementos paisagísticos, humanos ou
animais. A paisagem é monótona: neve, árvores, um homem e um cão; e tudo gira
em torno dos movimentos e gestos que o homem vai efetuando. O único corte com
esta monotonia é o vermelho da fogueira, nas poucas vinhetas em que surge. Mesmo
do homem pouco se vê. Todo o corpo está sempre tapado e apenas a boca, o nariz
e os olhos são visíveis e são apenas os olhos que transmitem as emoções:
desespero, medo, esperança, resignação.
O cão é apenas um elemento que mostra a desadequação do homem
naquele habitat.
A maior parte das vinhetas encontra-se delimitada por um
traço negro. Outras prolongam-se na vinheta seguinte, ou absorvem as limitadas
por moldura, fazendo o leitor aproximar-se da cena ou a estender-se na paisagem
criando uma maior distancia com os factos que estão a ser narrados.
As tonalidades usadas são muito constantes, evidenciando o
tom acastanhado das roupas do homem na paisagem branca assim como a cor do
fogo. A cor do cão, quase branca, mostra a sua adaptação ao meio em contraste
com o homem.
O texto surge todo em legendas, dentro d emoldura, não
existindo qualquer diálogo. As letras são pretas sobre um fundo branco, num
tamanho e tipo que não dificultam a leitura.
O livro apresenta no final uma galeria de esboços, onde se
pode apreciar algum do trabalho que Chabouté fez para realizar esta obra, e
ainda uma pequena nota biográfica sobre o autor, escrita por João Miguel
Lameiras.
O desenho da capa usa também a contracapa, e parece-me o
ponto mais fraco do livro. Embora relacionado com o conteúdo da obra, não está
ao nível de todo o conteúdo que cada um dos desenhos de Chabouté transmite.
Conclusão
Excelente trabalho de Chabouté. Dentro do género de
adaptação de obra literária, é uma das melhores que já li. Bom trabalho no
texto e no desenho criando uma harmonia perfeita.
Um livro a não perder.
Boa tarde, já há alguns anos que sou leitor assíduo do seu blog.
ResponderEliminarE hoje ao ler este post, não resisto a pela primeira vez publicar um comentário, a felicita-lo pois as análises que faz, explanam exactamente o que penso e o que gostaria de saber dizer.
As minhas melhores saudações
Artur