Título original: Jusqu’au dernier
Argumento: Jérôme Félix
Desenho: Paul Gastine
Cor: Paul Gastine
Editora: Gradiva
Tradução: Jorge Lima
Data da Edição: 2021
Álbum cartonado: 72 páginas
ISBN: 978-989-785- 045-5
Preço: 16,50 €
Dimensões: 318 x 239 mm
Análise
Ler este livro é uma surpresa. Quando parece que o argumento
se encaminha num determinado sentido, ocorre uma nova via e o leitor fica
surpreendido pela estrada que se abre. Nada ocorre como seria de esperar nas
histórias do género. Não há os bons e os maus. Todas as personagens têm essas
características, dependendo do ângulo pelo qual são olhados. Não há seres
perfeitos nesta história. Todos têm defeitos e o desenrolar do episódio
torna-os evidentes. Não há um herói capaz de vencer todos os inimigos, através
de estratégias que parecem tornar os adversários uns mentecaptos. Neste livro
todos são heróis e todos são vilões. Todos mentem, seja por interesse próprio,
por medo ou por altruísmo. Embora o final não tenha a intensidade da restante
obra nem o dramatismo que nela está sempre patente, não deixa de ser
inesperado.
É uma história colocada na época em que o comboio invadiu a
pradaria e os homens que faziam as longas jornadas transportando o gado,
começam a ficar sem trabalho e tentam arranjar outras ocupações. Neste livro
morre a ideia do cowboy idealizado em tantos outros westerns. Mais do que o
último homem, nesta história todos são homens, com os seus vícios, os seus
defeitos, os seus orgulhos e as suas forças.
Neste contesto, não se entende bem a opção do tradutor para
o título da obra em Português. Provavelmente, ele viu algo que o levou a fazer
esta tradução, mas, nem toda a gente, onde me incluo, vê o que se pretende
atingir com a designação de O último homem. A capa indica que Russel seria esse
último homem, mas ao ler a história não se percebe porquê. O título não faz
sentido, e transforma Russel num protagonista da história, que embora possa
existir, não ocorre de modo solitário. Esse protagonismo é partilhado por
outras personagens. Embora se possa considerar que ele, pelas atitudes que
toma, é o catalisador de todas as tragédias que vão sucedendo, estas não
ocorrem só por sua causa. Têm uma origem que pode ser partilhada pelos
comportamentos das outras personagens. A capa é boa, mas quando se associa a
imagem da capa ao título desaparece a coerência.
O desenho apresenta qualidade elevada, com a cor a ser
utilizada para salientar o dramatismo das cenas, seja em tonalidades mais
escuras, seja nos tons avermelhados que parecem transmitir a ira das
personagens. O desenhador recorre com frequência a grandes planos, transmitindo
bem os pormenores dramáticos e as emoções bem expressas nos olhares das
personagens. Os rostos poderiam, no entanto, ser melhor trabalhados, de forma
que a distinção fosse bem clara entre as personagens, designadamente entre
Kirby e Russel, que é a personagem retratada na capa, que por vezes são
demasiado semelhantes, apesar da idade que os separa. Isso faz com que Russel
em algumas vinhetas apresente um rosto demasiado jovem, quando os outros homens
o tratam por velho.
Algumas onomatopeias surgem nas pranchas, mas o mesmo não
ocorre com a simbologia cinética. No entanto, a plasticidade do desenho
consegue fazer perceber os movimentos das personagens, dando às cenas todo a dinâmica
que elas insinuam.
As legendas são minimalistas e surgem apenas quando há uma
mudança brusca de cenário ou uma grande evolução temporal, de modo que quer
espaço quer tempo, fiquem perfeitamente definidos.
Conclusão
Uma obra de leitura
obrigatória para os apreciadores de western. É uma diferença que marca no
argumento. As pequenas falhas apontadas não são minimamente suficientes para
desaconselhar esta leitura. Para quem não aprecia o estilo western também se
trata de um livro a ler, pois foge do padrão do género e é capaz de captar
outros leitores.
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