quarta-feira, 23 de junho de 2021

Análise crítica: O último homem ...

 



Obra: O último homem…
Título original: Jusqu’au dernier
Argumento: Jérôme Félix
Desenho: Paul Gastine
Cor: Paul Gastine
Editora: Gradiva
Tradução: Jorge Lima
Data da Edição: 2021
Álbum cartonado: 72 páginas
ISBN: 978-989-785- 045-5
Preço: 16,50 €
Dimensões: 318 x 239 mm

 

Análise

Ler este livro é uma surpresa. Quando parece que o argumento se encaminha num determinado sentido, ocorre uma nova via e o leitor fica surpreendido pela estrada que se abre. Nada ocorre como seria de esperar nas histórias do género. Não há os bons e os maus. Todas as personagens têm essas características, dependendo do ângulo pelo qual são olhados. Não há seres perfeitos nesta história. Todos têm defeitos e o desenrolar do episódio torna-os evidentes. Não há um herói capaz de vencer todos os inimigos, através de estratégias que parecem tornar os adversários uns mentecaptos. Neste livro todos são heróis e todos são vilões. Todos mentem, seja por interesse próprio, por medo ou por altruísmo. Embora o final não tenha a intensidade da restante obra nem o dramatismo que nela está sempre patente, não deixa de ser inesperado.

É uma história colocada na época em que o comboio invadiu a pradaria e os homens que faziam as longas jornadas transportando o gado, começam a ficar sem trabalho e tentam arranjar outras ocupações. Neste livro morre a ideia do cowboy idealizado em tantos outros westerns. Mais do que o último homem, nesta história todos são homens, com os seus vícios, os seus defeitos, os seus orgulhos e as suas forças.

Neste contesto, não se entende bem a opção do tradutor para o título da obra em Português. Provavelmente, ele viu algo que o levou a fazer esta tradução, mas, nem toda a gente, onde me incluo, vê o que se pretende atingir com a designação de O último homem. A capa indica que Russel seria esse último homem, mas ao ler a história não se percebe porquê. O título não faz sentido, e transforma Russel num protagonista da história, que embora possa existir, não ocorre de modo solitário. Esse protagonismo é partilhado por outras personagens. Embora se possa considerar que ele, pelas atitudes que toma, é o catalisador de todas as tragédias que vão sucedendo, estas não ocorrem só por sua causa. Têm uma origem que pode ser partilhada pelos comportamentos das outras personagens. A capa é boa, mas quando se associa a imagem da capa ao título desaparece a coerência.

O desenho apresenta qualidade elevada, com a cor a ser utilizada para salientar o dramatismo das cenas, seja em tonalidades mais escuras, seja nos tons avermelhados que parecem transmitir a ira das personagens. O desenhador recorre com frequência a grandes planos, transmitindo bem os pormenores dramáticos e as emoções bem expressas nos olhares das personagens. Os rostos poderiam, no entanto, ser melhor trabalhados, de forma que a distinção fosse bem clara entre as personagens, designadamente entre Kirby e Russel, que é a personagem retratada na capa, que por vezes são demasiado semelhantes, apesar da idade que os separa. Isso faz com que Russel em algumas vinhetas apresente um rosto demasiado jovem, quando os outros homens o tratam por velho.

Algumas onomatopeias surgem nas pranchas, mas o mesmo não ocorre com a simbologia cinética. No entanto, a plasticidade do desenho consegue fazer perceber os movimentos das personagens, dando às cenas todo a dinâmica que elas insinuam.

As legendas são minimalistas e surgem apenas quando há uma mudança brusca de cenário ou uma grande evolução temporal, de modo que quer espaço quer tempo, fiquem perfeitamente definidos.

Conclusão

 Uma obra de leitura obrigatória para os apreciadores de western. É uma diferença que marca no argumento. As pequenas falhas apontadas não são minimamente suficientes para desaconselhar esta leitura. Para quem não aprecia o estilo western também se trata de um livro a ler, pois foge do padrão do género e é capaz de captar outros leitores.

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