terça-feira, 16 de março de 2021

Análise crítica: Ao som do fado

 


Obra: Ao som do fado
Autor: Nicolas Barral
Cor: Marie Barral
Editora: Levoir
Tradução: João Miguel Lameiras
Data da Edição: 2020
Álbum cartonado: 88páginas
ISBN: 978-989-862-874-5
Preço: 10,90 €
Dimensões: 203 x 287 mm

 

Análise

A história pode dividir-se num prólogo de duas pranchas e oito capítulos, todos com um título e com número distinto de páginas.

O prólogo não tem nada de relevante. Relata o acidente que conduziria à morte de Oliveira Salazar, ajudando a localizar a história temporalmente, mas sem mais nenhuma relação com a restante narrativa. Não se fala da situação absurda que o país viveu, em que Salazar ainda pensava que governava. A própria questão da sucessão política não é abordada na história.

Tudo se passa em torno de um médico, que fez a guerra na Guiné, de onde não parece ter saído com qualquer trauma. Mostra a forma leve como encara a vida, sem se importar com as consequências que os seus atos podem ter. Consequências mais do que previsíveis dadas as suas relações com o irmão.

É essa sua conivência com a ditadura, que aparentemente ele não demonstra, mas de que deveria ter consciência, que leva a que o seu último ato não seja coerente com a personalidade que sempre adorou a proteção que sentiu e tudo  fez para a manter.

 Argumento bem estruturado, na perspetiva de sequência narrativa, mas com um comportamento da personagem principal pouco verosímil no final, considerando todo o comportamento do médico, que é dissecado na obra, pois toda ela gira em torno de si.

As pranchas encontram-se divididas em vinhetas perfeitamente definidas por moldura intercalada com espaço em branco. O número de vinhetas é variável, mas a maior parte das pranchas têm entre seis e oito. Existem algumas vinhetas maiores, que fazem diminuir o seu número por página, havendo uma prancha ocupada por uma única vinheta.

Sobre a qualidade do desenho apenas se podem fazer referências positivas. O autor usa muito bem os rostos para expressar as emoções das personagens e mesmo os seus pensamentos não expressos, conseguindo em simultâneo uma plasticidade nos corpos que mostra a vitalidade dos mesmos. Vê-se que são corpos vivos e não estátuas. O desenho também acrescenta elementos aos diálogos, complementando a história.

Os cenários são detalhados, sejam os exteriores ou os interiores, mostrando, no caso dos exteriores, a Lisboa do final da década de sessenta. Os pormenores paisagísticos que identificam a cidade são muito fortes e característicos da capital portuguesa.

A narrativa passa-se em diferentes épocas e a cor é usada para diferenciar as vinhetas que decorrem nesses dois diferentes tempos. Uma terceira tonalidade é usada para descrever uma situação onírica descrita no livro.

O tipo de letra e o tamanho estão adequados a uma leitura fácil, usando o autor, em algumas situações, o tamanho da letra para identificar distintas intensidades do som.

As legendas praticamente não existem. Apenas em duas vezes se identificam claramente, para fazer a localização espacial dos eventos narrados. Algum texto que surge em caixas, parecendo uma legenda, está no entanto a ser atribuído a uma das personagens sem que esta surja na imagem.

A capa é muito boa. Traduz perfeitamente a personalidade da personagem, mostrando ainda de modo mais evidente a estranheza que sente com a opção do argumentista no final.

Um outro elemento contribuinte da qualidade da obra reside no facto de ser uma publicação original, publicada ainda antes da que ocorreu em língua francesa, o idioma em que foi escrito.

Mais uma vez opta-se por não se indicar, incompreensivelmente, o título original deste livro.

Conclusão

Uma obra que se lê agradavelmente, bem desenhado, bem colorido, bem estruturado, mas com um fim inverosímil que agradará a todos os que gostam de finais felizes e românticos.


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