Título original: Les Indes fourbes
Argumento: Alain Ayroles
Desenho: Juanjo Guarnido
Editora: Ala dos Livros
Data da Edição: 2021
Álbum cartonado: 160 páginas
ISBN: 978-989-54726-8-0
Preço: 32,00 €
Dimensões: 341 mm x 252 mm
Análise
Esta obra pretende dar continuidade a um livro publicado em
Espanha no século XVII, a que, na época, o autor prometia dar seguimento. El
Buscon era esse livro, presume-se que da autoria de Francisco Quevedo, uma criação
nunca assumida, talvez por causa da Inquisição. El Buscon não teve continuidade
e Alain Ayroles decidiu criar uma possível sequência à narrativa original.
Tal como o livro publicado, a continuação divide-se em três
capítulos. Há algum desequilíbrio na forma como a história é contada. Existe um
excelente primeiro capítulo, que narrado por Dom Pablos, o protagonista, leva o
leitor a mergulhar na obra, sempre na procura da página seguinte. O segundo
capítulo desce de qualidade. A perspetiva do narrador é outra, surgindo mesmo
legendas narrativas de um segundo narrador, enquanto no primeiro esse papel
cabe à personagem principal. É um capítulo que se torna monótono, sem o ritmo
que a primeira parte imprimira. No terceiro capítulo há uma tentativa de
retomar o ritmo do primeiro, mas a forma como a narração se desenrola não o
permite.
Existe um epílogo que ficaria melhor integrado, se nele
constasse o episódio final entre o burlão e o rei, deixando a história por aí.
Saliente-se que neste trabalho de banda desenhada que há uma
referência muita direta ao pintor Velasquez, e ao seu famoso quadro As meninas.
A linguagem, que no primeiro capítulo tenta ser uma
sequência do estilo da obra original, perde-se nos capítulos seguintes. No
segundo capítulo porque quase tudo se desenrola em diálogos, e no terceiro
porque os diálogos, também muito abundantes, perturbam o estilo do capítulo inicial.
O desenho apresenta um estilo próximo da caricatura, com os
rostos a não apresentarem características reais, surgindo com deformações que
acabam por ajudar a distinguir e a identificar as personagens.
Bem desenhado, aproveita bem a caricatura dos rostos para
expressar emoções, não exagerando, dando sempre a impressão que o desenho é
totalmente realista.
Guarnido utiliza sempre que necessário símbolos cinéticos e
algumas onomatopeias. O formato dos balões e a letra são utilizados para
exprimir os gritos, a alegria e todos os outros estados de espirito que
percorrem as personagens. A parte que é narrada por Pablos surge em legendas,
com o fundo amarelo, permitindo distinguir o narrador. No segundo capítulo
apesar de se estar perante outros narradores, as características da legendagem
mantêm-se.
Existem vinhetas de muitos tamanhos, com Guarnido a utilizar
bem a sua distribuição nas páginas, para prender o leitor na sequência
narrativa, mantendo sempre uma qualidade elevada quer a vinheta seja pequena,
como quando numa prancha, por exemplo, se ultrapassam as 10 vinhetas, ou num
vinheta de dupla página onde mostra ao leitor a sua versão de El Dorado, que surge
com uma arquitetura demasiado helénica. O desenhador poderia ter arriscado um
pouco mais nesta gigantesca vinheta.
Surgem longas sequências de páginas sem palavras, com a
imagem a compor toda a história, que apesar dessa característica, apenas
pictórica, se consegue compreender de forma admirável. Uma das sequências mais
importantes é a que se encontra entre as páginas 67 e 77, que descreve a
chegada a El Dorado e os acontecimentos que se seguiram.
As vinhetas tanto surgem perfeitamente definidas, quase sempre,
como o desenhador as apresenta sem separação, ou então integradas umas nas
outras, conseguindo desse modo dar a sugestão de confusão e de pensamentos
pouco claros por parte do narrador.
A cor é de Guarnido, com exceção de algumas poucas páginas.
A análise dessas páginas não permite identificar nenhuma técnica diferente, nem
a razão que levou a optar por Jean Bastide para fazer a coloração.
A edição é de muito boa qualidade, tendo o papel uma
espessura que não permite transparências, o que se pode notar no peso do álbum,
e com uma textura que permite distinguir bem as cores, não as tornando
demasiado vivas.
A capa está perfeitamente adequada à obra, dando o devido e único
relevo a Dom Pablos.
Conclusão
Uma obra a ler, que merece ser guardada, para lá se regressar
regularmente.
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