domingo, 13 de dezembro de 2020

Análise Crítica: Lucky Luke - Um cowboy no algodão

 


Obra: Lucky Luke – Um cowboy no negócio do algodão
Título original: Lucky Luke (nouvelles aventures)  ) – Un Cow-boy dans le cotton
Editora: Asa
Data de Edição: outubro de 2020
ISBN: 978-989-23-4948-0
Desenho: Achdé
Argumento: Jul
Cor: Mel Acryl’Ink
Álbum cartonado: 48 páginas – 44 de banda desenhada
Dimensões: 293 mm x 225 mm
Preço: 10,90 €

Análise:

O argumento recorre à interação de Lucky Luke com personagens da história dos Estados Unidos, uma situação recorrente da série, que  já surgiu em muitos episódios anteriores. A novidade surge no facto de essa personagem se tratar de um negro que ocupou o cargo de Marshall Adjunto. Esta situação que pode ser associada aos múltiplos problemas raciais que atualmente se vivem nos Estados Unidos, com a o relevo que têm estado a ganhar os movimentos de supremacia branca, representados neste álbum pela Ku-Klux Klan.

Situada numa época em que a escravatura tinha sido abolida, são no entanto evidentes ainda as marcas que o sistema deixou na sociedade daquele país, neste caso representado pelo estado da Luisiana. Neste âmbito salienta-se negativamente a tentativa de apresentar o oeste do país como sendo uma zona livre de atitudes racistas, o que estava longe de ser verdade.

A melhor época da série foi aquela em que Goscinny escreveu os argumentos, em que a fluidez narrativa e o humor marcaram os diferentes episódios. Com a  assunção, por Morris, da escrita dos episódios, notou-se o quebrar dessa espontaneidade e incapacidade de produzir humor naturalmente no fluir narrativo.

Este episódio, no que se refere ao humor, faz lembrar alguns dos momentos que Goscinny trouxe às páginas da série. A vontade de rir, ou apenas sorrir, surgem de modo natural na leitura, com o aproveitamento das diferentes personagens, das suas características e dos elementos cenográficos apresentados no contexto da história. Não surge, na maior parte das situações, o humor forçado.

Como em episódios anteriores surge um piscar de olho à atualidade fazendo aparecer duas crianças que podem ser associadas a duas personagens conhecidas dos tempos atuais: a pequena Oprah e o jovem Barack.

De forma natural surgem também no episódio, as personagens ficcionais Tom Sawyer e Hucklberry Finn criadas pelo escritor Mark Twain.

Os Dalton também marcam presença neste álbum, numa participação pouco intensa, mas suficiente para alguns bons momentos de humor.

O argumento flui de modo natural quase até ao final. No completar da narrativa é verificável a dificuldade do argumentista em resolver a ação. Surge quando Lucky Luke fica incapaz de solucionar, por si, ou com a ajuda do seu cavalo, o problema em que se encontra, sendo salvo por outra das personagens, que surge naquele momento, vinda do nada, embora apresente uma justificação, forçada, para a sua presença. Normalmente Lucky Luke resolveria com Jolly Jumper os problemas em que se encontrava. Neste caso sucedeu de outra forma.  Também do nada, surge um furacão, que é um fenómeno, que ao contrário dos tornados, não surge de modo brusco, havendo sempre alterações meteorológicas anteriores que o prenunciam. Neste caso surgiu sem aviso. Tivesse o argumentista conseguido resolver estas duas situações de modo mais eficaz e estaríamos perante um dos melhores argumentos da série.

As relações sociais surgem de modo muito caricatural no episódio, o que já não é uma novidade nesta série, com os negros a serem todos bons, os brancos americanos a serem todos maus e os descendentes dos franceses a viverem completamente arredados da sociedade dos americanos. A introdução de algum elemento dissonante dentro dos grupos étnicos poderia contribuir para criar algumas situações humorísticas.

Achdé  é um desenhador que conseguiu apanhar o traço de Morris. O traço é leve, adequado a uma história em que o movimento é um elemento importante da leitura e da sequência narrativa. O desenhador consegue desenhar os corpos nas diferentes posições que lhes transmitem uma plasticidade que os transforma, apesar do traço caricatural, em personagens animadas.

Os elementos cenográficos são bastantes diversificados e por vezes minuciosos. O autor desenha vinhetas pequenas, que normalmente lhe permitem colocar de oito a onze vinhetas em cada prancha, mas arrisca por vezes algumas vinhetas maiores, não poupando nos pormenores cenográficos. Das vinhetas gigantes, uma análise mais negativa, vai para a da prancha trinta e nove, que parece ser a menos conseguida. De salientar, na prancha seguinte, as três vinhetas que ocupam todo o comprimento da prancha e que conseguem transmitir na perfeição a narrativa que lhe está associada. Trata-se de uma exemplo em que a história tem que ser obrigatoriamente lida com a opção gráfica tomada pelo desenhador.

A paleta de cores é variada e adequada a cada contexto narrativo, como por exemplo o verde, quando em fundo se encontram os pântanos ou ambientes ajardinados, ou tons escuros para cenas noturnas.

Quase toda a narrativa decorre com os diálogos dos balões. O texto em legendas é muito raro, com exceção da prancha seis, onde não há um evoluir narrativo, mas uma explicação histórica sobre o enquadramento social nas plantações da Luisiana. Quase toda a história poderia decorrer sem a presença das legendas, percebendo-se o enredo apenas pela leitura de desenho e texto.

A letra é bem legível, surgindo em tamanho adequado a permitir a leitura fácil.

Ao longo da narrativa surgem algumas onomatopeias, assim como balões com simbologia, ou formatos de letra que exprimem emoções.

Para expressar movimento existem alguns símbolos cinéticos, embora a plasticidade do traço já o evidencie, e mais alguma simbologia, em torno dos rostos, de modo a amplificar as emoções que os semblantes expressam.

 

Conclusão:

Um livro que vale a pena ler. As suas poucas insuficiências a nível do argumento ou do desenho, são superadas pelos aspetos positivos.

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